Uma alegria, um presente, um privilégio sem tamanho participar desse festival tão importante para o teatro brasileiro para crianças e jovens.
O Fenatib é também muito importante para a formação de público, mas sobretudo para formação de artistas e companhias do Brasil inteiro.
Esses são alguns dos registro da nossa passagem com um dos nossos trabalhos mais recentes, o Baleila.
Foto: Giba Oliveira
Foto: Giba Oliveira
Foto: Giba Oliveira
Foto: Giba Oliveira
Tivemos o prazer de ter nosso texto sobre direção publicado na revista Panacea do Inarti. Segue texto:
Uma direção a três corações e muita paixão
Samuel Paes de Luna | Sidineia Köpp | Thiago Becker
Panorama de uma direção coletiva, intuitiva, calcada na experiência prática e na vivência em salas de aula.
Um grande balão prestes a explodir. Uma panela de pressão que ferve ideias, pensamentos, sonhos e anseios. Essas imagens podem ilustrar perfeitamente o funcionamento da cabeça do artista criador, seja na atuação, direção ou encenação. O desejo e a necessidade de nos expressar é uma constante.
Na função de direção, os desafios de coordenar tantos elementos para o desenvolvimento de uma proposta cênica multiplicam essas imagens de turbilhão e efervescência. O diretor é, em primeira mão, a cobaia daquilo que ele mesmo está construindo. Criador e espectador de sua montagem. O que movimenta as peças do todo. O olhar de fora que prevê o que chega e o que não chega com a devida potência. Aquele que percebe o que tem e o que não tem eficácia na comunicação cênica. O diretor é presença fundamental nos processos de criação. Indispensável na condução e escolhas que comuniquem e que alcancem o público de forma objetiva, sensível e criativa. No teatro feito para crianças, é indispensável que o diretor esteja conectado com questões da infância. É preciso estar atento, sobretudo, às formas de diálogos e comunicação em todas as fases infantis.
Partindo da necessidade e urgência de falar o que ainda é pouco dito, há temas que gritam e puxam pelo braço, daí brota a necessidade de transformá-los em uma experiência artística.
No caso do espetáculo Baleila, que estamos apresentando no 24º Fenatib, a direção se deu coletivamente, a seis mãos: Somos Samuel Paes de Luna, Sidineia Köpp e Thiago Becker. Somos atores, produtores culturais, professores de teatro e contadores de histórias. Construímos uma encenação intuitiva, calcada na experiência prática da cena e em salas de aula, com crianças e pré-adolescentes. O desejo de trabalharmos juntos já era latente há algum tempo. Sidineia já foi professora de teatro do Thiago. Samuel e Thiago já trabalham juntos na Cia Cobaia Cênica há quatro anos.
Nós três nos encontramos para esse trabalho e descobrimos alguns caminhos que nos deixaram muito entusiasmados. Somos três apaixonados pelo que fazemos e profundos admiradores uns dos outros, o que facilitou essa construção. Em Baleila, como um chamado, seu conteúdo nos bateu à porta, devido aos números crescentes e alarmantes de casos de violência sexual contra crianças nos últimos anos. Recebemos alguns convites para trabalharmos esse assunto de forma teatral, para grupos de crianças e jovens atendidos pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social de nossa cidade, sendo esse nosso ponto de partida.
Diante de um conteúdo tão delicado e desafiador, pois não tínhamos nada em repertório com essa abordagem, e depois de debater e refletir bastante sobre como e por onde começar, chegamos à conclusão de que precisávamos construir uma proposta cênica que se comunicasse direta, assertiva e carinhosamente com esse público-alvo já tão afetado por essa violência. Além disso, decidimos que essa experiência precisava ser, sobretudo, leve, poética, suave, profunda, lúdica, reflexiva, colocando inclusive um tom de encorajamento e sensibilização para denúncias. Nossa intenção era que também fosse uma experiência bonita e de encantamento, apesar do horror que tudo isso significa, mas pensando em não reproduzir o que determinadas crianças já passam, no seu cotidiano. Pensamos em trazer um novo olhar para essa dor, ressignificando essa tragédia, propondo ferramentas de alerta, acolhimento e compartilhamento. Nós já tínhamos então o conteúdo e a quem se destinaria o trabalho. Agora era preciso encontrar materiais que nos servissem de base para transpor tudo isso para a linguagem teatral. Já havíamos lido algumas outras literaturas com temáticas complexas e delicadas para esse público, entre elas o livro Leila, de Tino Freitas, que inspirou fortemente esse trabalho e cuja história aborda o abuso e o assédio de um polvo contra uma baleia. Resolvemos então nos debruçar nessa obra, além de reportagens e matérias jornalísticas que nos trouxeram dados estatísticos assustadores como base. A partir daí, as possibilidades e opções de caminhos cênicos só aumentavam, cada vez que aprofundávamos e desdobrávamos o tema, toda vez que nos encontrávamos para ler e ouvir aquelas palavras e suas estruturas.
Em Leila, o cenário é um fundo de mar com dois personagens: uma baleia e um polvo, como dito anteriormente. O elemento água, então passou a ser o nosso Norte, o conceito a ser investigado e experimentado. A partir disso, buscamos expandir essa ideia, ressignificando objetos do universo molhado como capas, guarda-chuvas e galochas para o ambiente marítimo. O teatro nos dá essa licença e provoca nos espectadores a capacidade de imaginação, transformação e releitura das coisas, o que as crianças já fazem com muita naturalidade. A modernidade e a necessidade de estarmos sempre inovando apontam caminhos diversos para a encenação, seja na inserção de tecnologias ou na integração de várias artes e linguagens. Mas acreditamos que, seja qual for a proposta cênica, a força está sempre na atuação, na condução das palavras e estados emocionais, na presença e na comunicação direta com o público, potencialidades essas que estão nas mãos da atriz, do ator. E partimos daí, da figura de quem conta a história, pois a identificação imediata do público é humana e depois vêm as camadas materiais, visuais e sensoriais de conexão com a obra. A criança tem um olhar e uma entrega de si muito mais propensa ao lúdico, ao colorido e a experiências extra-cotidianas. Isso não quer dizer que, para isso, a direção precise apontar para formas alienadas da realidade ou que subestimem a capacidade de compreensão e visão de mundo da criança. Pelo contrário, a realidade e as questões humanas precisam estar presentes, sendo discutidas com normalidade, embora com ferramentas diferenciadas, atraentes aos olhares que aprendem mais eficientemente por meio de jogos, brincadeiras, imagens e sensações.
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